(...) O nome do lugar já existia antes da ermida dedicada ao apóstolo S. Bartolomeu, de que se tem conhecimento desde 1482, portanto sendo a ermida anterior a esta data, ou o topónimo Pechão foi acrescentado ao de S. Bartolomeu para o diferenciar dos outros, seus homónimos? E se foi acrescentado para o diferenciar de outros, porquê Pechão, e não outro nome qualquer? Chegados aqui, vamos examinar as várias hipóteses apresentadas pelos estudiosos na matéria sobre a origem do topónimo Pechão, como se escreve hoje, depois de se escrever Pichão, Peichão e Pexão, como se escrevia quando frequentei a Escola Primária, na segunda metade dos anos vinte. E, para começar, direi que há cinco versões diferentes para explicar a proveniência do nome da nossa freguesia. Mesmo assim e referindo-se ao assunto, diz o ilustre olhanense A. Henrique Cabrita no seu livrinho: "Olhão, subsídios para o estudo das origens dos topónimos do concelho", na pág. 19:
"Por carência de elementos e de dados seguros e incontroversos nada se pode afirmar, em termos rigorosamente concretos e categóricos, sobre o étimo deste topónimo. Quanto, acerca do assunto se tem dito e publicado, não passa de simples conjecturas, de meras e sempre falíveis hipóteses". Sendo assim, também eu adiantarei mais uma hipótese, que, pelos vistos, terá ou não terá a sua validade. Mas, primeiro, vamos examinar as versões dos estudiosos na matéria, que são as seguintes:
PRIMEIRA VERSÃO Pexão, ou Peixão, no sentido de "mulher bonita, formosa e bela", a que antigamente se ligou o lugar de S. Bartolomeu, do "peixão" , que seria essa beldade de outrora. Só que, segundo os eruditos na matéria, esse cognome atribuído a "mulher bonita, formosa e bela", um peixão, só muito mais tarde é que apareceu na nossa língua, numa obra de António Peliciano de Castilho, escritor do século XIX, quando o nome de Pechão era conhecido desde o século XV. Assim, esta hipótese não tem qualquer cabimento.
SEGUNDAVERSÃO Uma outra versão, sugestão do citado autor e filólogo olhanense A. Henrique Cabrita, seria a de Pé-chão, considerando-se pé por sopé, quer dizer, sopé dos Cerros de S. Miguel, Malhão e Guelhim, e chão, ou liso e plano o terreno adjacente, em que assenta a nossa freguesia. E diz ele, no atrás citado livrinho, pág. 22: "O solo ou terreno onde a freguesia está situada, uma espécie de anfiteatro, é liso e plano, sem elevações ou desníveis acentuados, já que é, pode dizer-se, como que um vale relativamente extenso, conforme pode facilmente observar-se ao longo da estrada que liga Olhão a Faro". Suponho que o Sr. Henrique Cabrita, além dessa faixa litoral, por sinal bem estreita, desconhecia o resto do enrugado terreno da freguesia que, na sua maior parte, é bastante acidentado, como já atrás descrevi no que diz respeito à orografia. E, ainda, que o sopé, ou pé, dos cerros de S. Miguel, Azinheiro, Malhão e Guelhim, toda essa área muito maior que Pechão, pertence às freguesias de Moncarapacho e Estoi, ainda mais velhas que a nossa. Portanto, parece-me bem que esta versão não tem qualquer fundamento. E o próprio A. H. Cabrita, estudioso na matéria, o diz no tal livrinho, pág. 23: "É mais uma sugestão, uma nova hipótese para o estudo do topónimo. Não tem ou não terá qualquer fundamento, mas... tê-lo-ão, porventura, as demais versões apresentadas?"
TERCEIRA VERSÃO Vamos à terceira hipótese, a de ser a origem do topónimo a existência de vinhas nesta área, da casta de uva pexã ou pechã, uva tinta boa para vinho, que ainda se conhece localmente por pechém. Esta versão, a meu ver, é mais realista que as duas anteriores, apesar de o Sr. Antero Nobre, no seu livro "O Termo de Olhão", escrever: "...nem há memória de por ali existirem ou terem existido vinhas", o que eu não compreendo, pois desde que me entendo existiam vinhas em Pechão (e ainda existem) e, pelo que os mais antigos me contavam e contam, muitas mais existiam antigamente. E também não compreendo que o Sr. Antero Nobre faça uma afirmação dessas, de que por aqui nunca teriam existido vinhas, depois de Ataíde Oliveira transcrever, na sua Monografia do Concelho de Olhão, trechos do mestre Silva Lopes em que fala de algumas vinhas nesta freguesia, assim como citações do "Portugal Antigo e Moderno" onde se menciona algum vinho, aqui produzido. E eu, que vou na casa dos setenta, conheci ainda muitas vinhas na nossa freguesia, e os mais velhos falavam-me que antes havia muitas mais, mas que em grande parte foram dizimadas pela filoxera que invadiu os nossos vinhedos aí pelos anos 1870-72. Agora, se a casta pexã ou pechão existiu em muita ou pouca quantidade, não sei, mas há cerca de vinte ou trinta anos atrás, ainda se cultivavam cepas dessa casta, boa para vinho. Só que, localmente, essa casta é conhecida por pechém. Contudo, outra questão se põe: seria por haver vinhas dessa casta que se deu o nome de Pexão ou Pechão ao lugar da ermida de S. Bartolomeu, ou quando se plantaram essas vinhas já o lugar era conhecido por esse nome, o que é mais lógico? E vamos à quarta hipótese, que é a do Pio-Chão, muito do agrado do Sr. Antero Nobre, e que o muito estudioso na matéria, o Sr. J. Fernandes Mascarenhas, aceita de bom grado e explica as razões no seu livrinho: "Origens dos Topónimos das Freguesias do Concelho de Olhão e de alguns dos seus sítios". Contudo, outro estudioso no assunto e mestre linguístico, o Sr. António Henrique Cabrita, não é da mesma opinião, contestando esta hipótese no seu livrinho: "Olhão, subsídios para o estudo dos topónimos do concelho".
QUARTA VERSÃO Ora, a versão ou hipótese de ser Pio-Chão a origem do nosso topónimo estaria ligada a que nos princípios do povoamento deste lugar existiu uma nascente ou fonte de água tida por milagrosa, e de que há memória ainda na nossa Fonte Velha, com inscrições alusivas datadas de 1754. Assim, pela existência dessa nascente natural e milagrosa, seria considerado um chão Pio, Sagrado, o terreno circundante, o que levaria a chamar-se ao lugar, já com a Ermida dedicada a S. Bartolomeu, S. Bartolomeu do Pio-Chão, o que, com o decorrer dos anos e acertos de linguagem, se passaria a escrever Pichão e depois Pechão. Quanto a mim, acho a hipótese bastante verosímil. Contudo, o investigador e erudito Sr. A. Henrique Cabrita não encontra a hipótese viável, porque, para o ser, teria que se escrever ChãoPio, isto é, primeiro o substantivo, depois o adjectivo, como é corrente na nossa língua, assim como dizer homem gordo e lua cheia, e não gordo homem, cheia lua. No entanto, a mim não me parece essa maneira de ver muito concreta e absoluta, pois há muitos nomes compostos com o adjectivo em primeiro lugar, como por exemplo: Belo-Romão, e não Romão-Belo; Bela Mandil, e não Mandil Bela; Doce-Lima, e não Lima-Doce, etc. A própria Brancanes, que originariamente seria Eanes Branca, e muitas outras. Por mim, aceitaria logicamente que fosse PioChão a origem do nome da nossa freguesia, se não houvesse outra versão que, quanto a mim, considero a mais viável, e que é a única veiculada pelo povo e pela tradição.
QUINTA VERSÃO É a de que seria "Peixão", no sentido de grande peixe, além de ser a versão popular, contada pelos mais velhos, de pais para filhos, a qual ouvi desde a meninice, muitas vezes da boca de meu avô materno, que nasceu em 1840, nas cercanias da nossa Igreja Matriz. E aqui, mais uma vez faço menção do mestre Ataíde Oliveira, quando diz: "O povo estabelece, narrando de pais a filhos os factos mais antigos, uma cadeia que prende o passado ao presente. Pode muitas vezes alterar a verdade histórica, mas no fundo da lenda encontra-se alguma coisa de verdadeiro" . E essa tradição, essa lenda popular diz que, em tempos idos, criou-se, apareceu, um enorme peixe, portanto, um "peixão", aqui na nossa ribeira de Bela Mandil, e que daí se começou a chamar S. Bartolomeu do Peixão, ao lugar onde se encontrava a primitiva ermida dedicada a esse Santo Apóstolo, a qual já existia em 1482, pertencente à freguesia de Sta. Maria de Faro, e já "aprestimada" ao Prior-Mor da Ordem e Mestre de S. Thiago, o Padre Fr. Pedro Diaz. O Sr. Antero Nobre, no seu livrinho "O Termo de Olhão", diz, a dado passo: "...mas nem ali houve algum peixe, mesmo de água doce, nem há memória de por ali existirem ou terem existido vinhas". Sobre as vinhas, já atrás demonstrei que não é assim como o Sr. Antero Nobre diz. E sobre o nunca ter havido aqui peixe, também vou demonstrar que não é correcta essa afirmação, com factos do meu conhecimento directo, e que passo a expor. Em primeiro lugar, chamo a atenção de quem me ler para o facto das condições ecológicas locais não serem agora como eram há sessenta e mais anos atrás. Nessa época, com os invernos muito mais chuvosos que agora e mais anos seguidos de invernia, eu conheci este curso médio da Ribeira de Bela Mandil, aqui na parte central da freguesia, junto à nossa pequena aldeia, a montante e a jusante da famosa Fonte Velha, a tal das águas milagrosas, com pegos enormes onde a água se mantinha durante todo o verão. E conheci alguns desses pegos povoados por eirozes, que é um peixe da espécie das enguias, as quais em pequenas sobem as correntes de água doce, desde o mar onde se reproduzem, e vêm desenvolver-se nesses pegos de águas tranquilas, até ao inverno seguinte em que voltam para o mar com as novas enxurradas. Esta parte da ribeira era então muito frondosa, com árvores de grande porte, especialmente alfarrobeiras, e várias espécies de moitas e silvados, formando um aprazível ambiente e, nos pegos de águas tranquilas, especialmente no chamado Pego Grande, logo abaixo da Fonte Nova, existiam as tais eirozes, em maior ou menor quantidade, conforme os anos eram mais ou menos invernosos. E nós, mocinhos de escola, e outros que não eram de escola, armados de anzóis e linhas, fazíamos a nossa pesca desportiva e muitos tomávamos banho nesses pegos. Isto é que é a verdade, e do meu conhecimento directo, a existência de peixe neste lugar. Ora, muito logicamente e recuando no tempo, seremos levados a imaginar uma ribeira ainda mais propícia para contenção e desenvolvimento dessa espécie de peixe e nada mais natural do que na antiguidade e nos primórdios da existência e afirmação da população local ter-se desenvolvido algum peixe de invulgar tamanho a que chamariam um peixão, o que, num seguimento lógico de linguagem, levaria a que se passasse a denominar o lugar, com a sua ermida, S. Bartolomeu do Peixão ou Pexão. Assim, esta versão muito lógica e coerente, e sendo a versão popular desde sempre, parece-me ser a que tem mais visos de verdade.
VERSÃO DO AUTOR Contudo, como atrás prometi, ainda falta expor a minha hipótese, que é a seguinte: como é sabido, há vários topónimos que têm origem em línguas estrangeiras. Estou-me a lembrar da Arrochela, que seria de origem francesa; Alfandanga, Bela Mandil e outras de origem árabe; Jordana e Maragota que seriam de origem castelhana, e ainda Quelfes que, segundo alguns investigadores, seria de origem italiana. Assim, a minha versão sobre a origem do topónimo Pechão, poderia derivar do castelhano, da seguinte maneira: é sabido, pelos que lêem e estudam, que os filhotes de pomba são chamados "pichones" CJTI língua espanhola, ou castelhana, mais propriamente dita. E o que nós em português chamamos borrachos, como quem diz os pintainhos das pombas. Ora poderia muito bem ser que nessa primitiva ermida de S. Bartolomeu alguma pomba fizesse o seu ninho c que algum castelhano, que por aqui andasse, tivesse descoberto algum pombinho na ermida, "pichon", na sua língua, e daí em diante designasse a ermida de S. Bartolomeu do "pichon", nome que passaria a Pichão, em português, como a princípio se escreveu, e mais tarde Pechão. E tanto isto poderia ser que nesta data em que escrevo, Junho de 1987, e já depois de ter pensado maduramente nesta minha hipótese, ao deslocar-me um dia ao cimo da torre da nossa Igreja Matriz, em companhia duns amigos, deparámos com dois ninhos de pombas nos degraus da escada da torre, já com os respectivos ovos! Até parece um achado de propósito ao encontro do meu pensamento. E quando as pombas ainda procuram o abrigo dessa torre para sua nidificação, melhor o fariam nesses recuados tempos, em que as condições ecológicas e de sossego seriam muito mais propícias. Chegados aqui, parafraseando A. Henrique Cabrita, posso dizer: "E mais uma sugestão, uma nova hipótese para o estudo do topónimo". Até que alguma descoberta documental, ou alguém com dados concretos e incontroversos, ponha os pontos nos ii, definitivamente.
(se fores ao site da Junta de Freguesia de Pechão e clicares na secção "História", poderás ver este texto e mais algumas informações sobre a história de Pechão)
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